Em 1997, foi registrada a última grande enchente do município de Jequitibá. Na ocasião, a cidade que tem pouco mais de cinco mil habitantes, ficou totalmente submersa. Na madrugada do último sábado (25) o pesadelo voltou. Por volta das 3h da madrugada, o estridente som da sirene foi ouvido: era o alerta para que moradores que residem próximo ao Rio das Velhas e na região central do município deixassem suas casas. Hoje, a cidade está parcialmente alagada com comunidades rurais isoladas, já que algumas travessias foram levadas pelas águas. No entanto, apesar das diversas solicitações da Prefeitura Municipal de Jequitibá para que se decrete a situação como de emergência, o município não é reconhecido pelo estado e nem aparece nas relações da Defesa Civil Estadual.
Poliana Valgas, secretária de Meio Ambiente de Jequitibá e secretária-adjunta do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas), lamenta o descaso. “Estamos com dificuldade em até manter contato com a Defesa Civil Estadual. Não temos qualquer retorno. O município passa por uma situação grave, está parcialmente alagado e com famílias desabrigadas e desalojadas. Perdemos pontes e comunidades rurais estão isoladas. Lamentamos que, até o momento, o governo do estado não reconheça a situação de de emergência, ainda no domingo, por Jequitibá”, afirmou.
Uma lista atualizada – com as cidades em situação de emergência e calamidade – é aguardada para esta terça-feira (28). A redação do CBH Rio das Velhas também tentou contato com a assessoria de imprensa da Defesa Civil Estadual. No entanto, as mensagens e telefonemas não foram respondidas e atendidas.
O caso Jequitibá só não é mais grave porque, ao contrário de 1997, houve um aviso quando a cheia começou a atingir a cidade por meio do Sistema de Alerta de Eventos Críticos – ferramenta operada pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM), e que conta com o aplicativo Hidroweb Mobile, que revela em tempo real, todas as informações relacionadas aos níveis dos rios e os volumes de chuva. Assim, a população foi alertada e com um aviso prévio evitou-se que a situação se tornasse ainda mais caótica.O Rio das Velhas subiu mais de 11 metros entre sexta-feira até domingo (26). A Lagoa Pedro Saturnino, no centro da cidade, transbordou.
“Foi desesperador. Haviam pessoas gritando na rua para que eu tirasse minha família de casa. Estava alagando, a água já batia nos joelhos do lado de fora. Deu tempo de tirar alguns móveis e geladeira …mas ficou para trás o sofá e armário. Mas o mais importante está salvo: a minha família e meu filho, que vai completar um aninho em fevereiro”, comemorou Rafael Júnior, que mora com a esposa e o filho próximo à principal Lagoa de Jequitibá.
Leoman Geraldo Lopes é servidor público e, como voluntário, ajudou a Defesa Civil Municipal no monitoramento do rio através das réguas instaladas em seu leito. “Subiu muito rápido a água. Ultrapassou os 10 metros, que é nossa última marca na central de monitoramento. Mas, graças a Deus, tivemos tempo necessário para avisar as pessoas e retirá-las de casa. O monitoramento não para neste período chuvoso, as condições do rio mudam rapidamente e todo cuidado é pouco”, afirmou.
Veja as fotos da atual situação do município:
As famílias que ficaram desalojadas estão abrigadas na Escola Estadual Vitor Pinto, onde foram hospedadas e alimentadas. Juliana Machado, psicóloga, trabalhou no acolhimento e acompanhamento profissional das mais de 40 famílias que tiveram de deixar suas casas. “São famílias que estavam bem próximas do dique de contenção de enchentes. Estamos acolhendo e escutando a necessidade de cada uma delas. Há muitas crianças e idosos, inclusive um deles passou por uma cirurgia e está acamado. Ainda existem pessoas resistentes, que não acreditam que o que ocorreu em 1997 não possa voltar a acontecer; por isso, não querem deixar bens materiais para trás, mas é questão de sobrevivência”, ressaltou.
A solidariedade era palpável em Jequitibá naquele sábado (25). Apressadamente, mas de forma organizada, moradores ajudaram uns aos outros na retirada de móveis das casas, que eram colocados em caminhões. Eduardo Sampaio, proprietário de supermercado próximo à lagoa, contou com a ajuda dos moradores para esvaziar as gôndolas. “É uma precaução, melhor retirar todo o estoque do que correr o risco de se perder tudo quando a água chegar. Nesse momento não existe concorrência, a solidariedade fala mais alto e todos são companheiros. É um ajudando o outro no que for preciso”, contou enquanto enchia um caminhão de mercadorias.
Desde domingo (26), com a cheia ultrapassando os 11 metros, a ponte que liga Jequitibá à Santana de Pirapama foi interditada por medida de segurança. A água estava a poucos centímetros de ultrapassar o nível da passagem de veículos e já invadia ruas da cidade. Poliana Valgas também está à frente do Comitê de Crise formado pela Prefeitura. “Antes mesmo de acontecer alagamentos o Comitê de Crise já estava reunido para colocar em prática o plano de contingência. As estratégias foram atualizadas em caso de inundação, que acabou acontecendo. No total temos 59 desabrigados, que estão na escola, e outros 64 pessoas realocadas em casa de parentes”, relatou.
Para Valgas, o sistema de alerta funcionou muito bem. “Conseguimos retirar pessoas de forma organizada graças ao Sistema de Alerta. Através dele sabíamos a dinâmica do rio, o que facilitou na tomada de decisões. O Serviço Geológico do Brasil (CPRM), nos assessorou durante 24h, em todos os dias. A cada 30 minutos recebíamos informações novas. O Comitê de Crise foi excelente no trabalho de antecipação à enchente. Estão todos abrigados com café, almoço e janta. Recebemos muitas doações de moradores de cidades vizinhas, e ainda precisamos de material de higiene, alimentos e cobertores”, destacou.
Ela também ressaltou seu agradecimento a todas as secretarias municipais, voluntários, Polícia Militar, Defesa Civil Municipal e Serviço Geológico do Brasil (CPRM). E destacou a importante parceria do Corpo de Bombeiros, o qual esteve presente nos momentos mais tensos durante as fortes chuvas.
Infelizmente, não houve apoio da Defesa Civil Estadual.
Sete Lagoas – A cheia do Rio das Velhas também atingiu o sistema de abastecimento público de água de Sete Lagoas. O local onde está situada a captação da Estação de Tratamento de Água (ETA) do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) – em Funilândia, às margens do rio – foi completamente submersa. Em comunicado nas redes sociais, o prefeito Duílio de Castro anunciou que a Prefeitura de Sete Lagoas vai minimizar o problema com a disponibilização de caminhões pipas. Na manhã desta terça-feira (28), bombearam 310 litros/segundo, a estação voltou a operar. Cerca de 40% da cidade depende da captação superficial.
Assessoria de Comunicação CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto e fotos: Celso Martinelli
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