Iniciativa do CBH Rio das Velhas democratiza o processo de seleção
Texto: Natália Fernandes Nogueira Lara
Em 2015, o Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas) convocou os subcomitês, as prefeituras e instituições ambientais a apresentarem demandas espontâneas de estudos, projetos e obras, visando à racionalização do uso e a melhoria dos aspectos qualitativos be quantitativos dos recursos hídricos na Bacia. As demandas deveriam ser coerentes com o Plano Diretor e com o Plano Plurianual de Aplicação 2015-2017, com previsão orçamentária de R$ 500.000,00 por Unidade Territorial Estratégica (UTE). Mais de 40 propostas envolvendo 21 UTEs foram recebidas e a priorização dos projetos foi feita pela Câmara Técnica de Planejamento e Controle (CTPC) do CBH Rio das Velhas, com o apoio da AGB Peixe Vivo.
Para esclarecer o processo, a Revista CBH Rio das Velhas entrevistou as assessoras técnicas da AGB Peixe Vivo, Jacqueline Evangelista Fonseca e Patrícia Sena Coelho Cajueiro, que acompanharam todas as etapas do chamamento. O coordenador da CTPC, Matheus Valle de Carvalho e Oliveira, também fez um relato sobre o processo.
Da esq. p/ dir.: Jacqueline Fonseca e Patrícia Coelho
Em 2015, o CBH Rio das Velhas publicou a Deliberação Normativa que dispôs sobre os mecanismos de proposição de projetos potenciais para a Bacia. Em anos anteriores houve algo parecido ou foi inédito?
No CBH Rio das Velhas foi feito pela primeira vez em 2015. Existe uma experiência positiva no Comitê do Rio São Francisco, no qual já estamos na terceira família de projetos, de forma que utilizamos o mesmo procedi-mento para o Rio das Velhas.
Antes dessa experiência que nós fizemos em 2015, o CBH Rio das Velhas executou alguns projetos que foram apresentados diretamente ao Comitê, sem haver um processo definido.
Foi proposto pela Agência ou demandado pelo CBH Rio das Velhas?
Podemos dizer que foram as duas coisas. Foi uma sugestão da Agência pelos bons resultados que vemos no Comitê do Rio São Francisco, alinhada com a vontade do CBH Rio das Velhas. Essa mudança está diretamente ligada à experiência da Agência, mas principalmente ao amadurecimento do Comitê.
A princípio apresentamos à CTPC como o procedimento é realizado no São Francisco e houve uma aprovação geral e o entendimento de que seria útil para o Rio das Velhas.
Qual é o papel da Câmara e da AGB Peixe Vivo?
São papeis bem definidos. A Câmara como parte do Comitê define, decide e delibera. Já a AGB Peixe Vivo assessora os processos. É importante ressaltar que a Câmara leva sugestões e embasamento para as decisões, mas quem decide mesmo é a Plenária, que é soberana. Ou seja, a Câmara tem um entendimento, toma uma decisão e leva à Plenária para aprovação. Depois de aprovado, a AGB Peixe Vivo participa do processo para acompanhar e assessorar.
Como foi conduzido o processo?
A proposta formatada pela CTPC com o apoio da AGB Peixe Vivo foi levada à Reunião Plenária do CBH Rio das Velhas no mês de maio para validação dos critérios e requisitos para a composição das demandas por parte dos subcomitês. Com a aprovação da Plenária, o Ofício Circular nº 097/2015 de chamamento para a submissão de projetos foi publicado e os interessados tiveram um prazo de 13 de maio a 24 de julho para o envio das propostas. Este prazo acabou sendo prorrogado em uma semana. Ao final, das 23 unidades territoriais estratégicas que compõem a Bacia do Rio das Velhas, 21 apresentaram uma ou mais propostas, totalizando 42 demandas espontâneas. Apenas a UTE dos Ribeirões Tabocas e Onça e a UTE Rio Pardo não inscreveram nenhuma demanda. Podemos dizer que foi um processo democrático e transparente.
A quantidade de demandas recebidas era esperada ou superou a expectativa?
Superou muito a expectativa da AGB Peixe Vivo. Apenas duas das 23 UTEs não enviaram propostas e foi muito interessante ver o envolvimento de todas as partes. Nós temos desde subcomitês mais experientes e que enviaram a demanda totalmente fundamentada até outros que estão participando pela primeira vez e enviaram as propostas em formatos diversos. Mas, todas essas participações são importantes e contribuem para a evolução do Comitê como um todo. Foi um processo extremamente rico. E acreditamos que a tendência é que isso seja cada vez maior.
Após o recebimento das demandas, como foi feita a priorização e a seleção?
As propostas recebidas pelo CBH Rio das Velhas foram encaminhadas à AGB Peixe Vivo para uma avaliação preliminar da coerência, pertinência e oportunidade das demandas, bem como do atendimento ao conteúdo mínimo estabelecido no Ofício Circular.
Após a avaliação, a Agência informou à CTPC, por meio de Parecer Técnico, que apesar da identificação de algumas pequenas inconsistências, todas as 42 demandas apresentadas foram consideradas conformes. Ou seja, poderiam ser incluídas na etapa de priorização das demandas, a cargo da CTPC do CBH Rio das Velhas.
Assim, nos dias 14 e 15 de setembro, foi realizada uma reunião da CTPC, quando todos os proponentes tiveram 10 minutos para exposição de suas respectivas demandas, que foram discutidas e avaliadas pelos conselheiros da Câmara, com o auxílio da Diretoria Técnica da AGB Peixe Vivo. Ao final, quatro demandas foram classificadas como “fora de pauta” e 38 aprovadas e hierarquizadas no âmbito de cada UTE.
Considerando-se a execução de pelo menos um projeto por UTE, a hierarquização estabelecida e o orçamento máximo de R$ 500 mil por UTE, foi sugerida a contratação imediata de 26 projetos, sendo 17 hidroambientais e nove de saneamento básico. Os projetos restantes serão licitados na sequência 2016-2017.
É importante destacar uma iniciativa que acabou colaborando muito na condução dos trabalhos. Ao encaminhar as propostas, quando havia mais de uma por UTE, o próprio subcomitê pré-avaliou e indicou qual seria de alta ou média relevância. Coube à AGB Peixe Vivo concordar porque não há nada mais legítimo do que o próprio subcomitê indicar quais são as necessidades prioritárias.
Após a análise do CBH Rio das Velhas e AGB Peixe Vivo os projetos foram aprovados em Plenária
Como será a contratação dos projetos?
A licitação para a execução dos projetos demanda a elaboração de um termo de referência para cada um dos 26 projetos que serão executados. Dessa forma, visando agilizar o processo, nesta primeira etapa serão contratadas três empresas que possam elaborar esses termos. A expectativa é que haja uma definição até março de 2016.
Após a definição das três empresas, será dado início à elaboração dos termos, fase que demandará a participação dos subcomitês a fim de fazer com que o documento atenda precisamente à demanda. O termo de referência vai explicitar o que será feito no projeto, a necessidade, o local, a abrangência, o modo, o prazo, entre outras especificações. Ou seja, é um detalhamento da proposta idealizada pelo subcomitê. Além disso, é por meio de cada um desses termos que nós vamos ter conhecimento de quanto cada um dos projetos vai custar. O prazo para lançamento dos termos é de cinco meses.
Depois de elaborados os termos será feita numa nova rodada de licitação, por meio da qual serão contratadas as empresas executoras dos projetos.
Por que foi estabelecido valor de R$ 500 mil por UTE?
O valor foi estabelecido com base no Plano de Aplicação Plurianual 2015-2017. Como são 23 UTEs, o valor foi mensurado inicialmente de modo que fosse empregado R$ 500 mil em cada uma. Poderia ser um projeto com utilização total do recurso, ou cinco projetos de R$ 100 mil ou dez projetos de R$ 50 mil e assim por diante, de acordo com o entendimento do respectivo subcomitê.
Em alguns casos, as demandas apresentadas possuem um escopo muito abrangente e será feita uma adequação a fim de não ultrapassar o limite. Na verdade, o valor inserido na proposta é ainda abstrato, não está efetivamente embasado em orçamentos, de modo que saberemos o custo real quando os termos de referência estiverem prontos.
Realidade das subbacias foram apresentadas
Em que medida vocês consideram que o processo por chamamento aprimora e contribui para o amadurecimento do Comitê na busca por uma melhor gestão?
Primordialmente, a criação de procedimentos, porque até então não havia processos definidos e o que nós implantamos esse ano é bem democrático.
Além disso, o fato da demanda partir do subcomitê é um grande avanço porque é na realidade local que estão as necessidades. Ou seja, partindo de quem está na localidade, a demanda tende a ser mais assertiva na busca da melhoria ambiental e da revitalização da Bacia, sendo este um dos maiores objetivos da aplicação do recurso obtido da cobrança pelo uso da água.
Enfim, o processo proporciona melhorias. Mas para melhorar é preciso começar, então nós começamos e vamos buscar o aprimoramento.
Matheus Valle de Carvalho e Oliveira – Coordenador da Câmara Técnica de Planejamento e Controle
“Tudo o que tem a ver com gerenciamento de recursos hídricos deve, necessariamente, ter um caráter democrático, de discussão pública e transparência. Afinal, os usuários dos recursos hídricos pagam a cobrança e têm não só o direito, mas também a legitimidade de deliberar sobre a forma como os recursos serão gastos. No CBH Rio das Velhas, além da Plenária, as Câmaras Técnicas têm se mostrado instâncias interessantes de debate público qualificado e aberto. O Velhas tem ainda essa proposta (que é também uma aposta!) de se abrir para as UTEs, através dos subcomitês, que espelham a diversidade local. O chamamento reforçou esse processo. Foi a primeira vez que fizemos dessa maneira e há aspectos a serem aprimorados. Mas estamos todos muito satisfeitos!
Foram recebidas 42 demandas espontâneas e o número surpreendeu. A quantidade de demandas mostra a força da mobilização dos atores e sua confiança no Comitê.
Quanto ao papel da CTPC no processo, o mesmo foi definido nas deliberações da Plenária e no próprio chamamento. Basicamente, tínhamos três tarefas: abrir um espaço de discussão com os proponentes das demandas (permitindo uma interlocução entre os atores locais, subcomitês e Câmara Técnica); validar a avaliação técnica prévia feita pela AGB (fortalecendo o importante papel do órgão técnico); e estabelecer uma priorização das ações a serem implementadas (com base em critérios do próprio chamamento, mas também levando em conta as discussões ocorridas). A CTPC funcionou então como uma ponte entre os níveis local e regional e entre o técnico e o político.
Na minha ótica, o processo aprofunda a proposta de envolver os níveis mais locais na gestão da Bacia como um todo, buscando uma escala de intervenção mais adequada. Outros países com modelos semelhantes, como a França, passaram por movimentos parecidos, quando foram buscando instrumentos para uma aproximação entre escalas”.
Temas importantes como disponibilidade hídrica, erosão do solo e saneamento são abordados pelos projetos
Acompanhe o processo de seleção.
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