A Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) aprovou o Projeto de Lei ‘Mar de Lama Nunca Mais’, que torna mais rígida a regulamentação e fiscalização de barragens no estado, no dia 22 de fevereiro. A votação do PL 3.676/16, que instituiu a Política Estadual de Segurança de Barragens, com o texto na íntegra da versão final do PL, foi realizada em uma reunião extraordinária e teve 65 votos favoráveis e nenhum contrário. No dia 25 de fevereiro, um mês após o rompimento da barragem de rejeitos da Vale, em Brumadinho, o PL foi sancionado pelo governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo).

Um dos destaques do projeto ‘Mar de Lama Nunca Mais’ é vedar novas barragens e ampliações ou alteamentos das existentes quando houver pessoas na “zona de autossalvamento”, área onde as autoridades não podem garantir o resgate. Outro destaque é a exigência de que as empresas adotem tecnologias de ponta para a disposição de rejeitos, o que garantiria mais segurança aos empreendimentos. O PL prevê também uma caução ambiental, que obrigará o empreendedor a garantir os custos da desativação das barragens e dos possíveis danos socioambientais e socioeconômicos que um desastre envolvendo tais estruturas possa ocasionar.

Em discurso, o governador afirmou que a sanção do projeto significa o fim das barragens a montante e que Minas Gerais sai à frente de todo o país com a medida. “Em três anos nenhuma barragem construída a montante existirá mais em Minas Gerais e, tenho certeza, nenhum sucessor meu vai enfrentar uma tragédia como a que ocorreu há um mês. A partir de agora, posso dizer que colocamos um ponto final nesse tipo de fato que realmente não pode mais acontecer. Que Brumadinho seja a última”, concluiu.

Outro ponto importante se refere ao licenciamento das barragens, que só poderá ocorrer em três etapas, com Licença Prévia, de Instalação e de Operação, sendo que para cada uma delas o empreendedor terá que apresentar diversos estudos específicos que antes não eram exigidos.

A aprovação significa uma vitória para o meio ambiente de Minas Gerais e sua população, e para todos os que participaram do PL ‘Mar de Lama Nunca Mais’, de iniciativa popular. A proposta foi entregue à ALMG em 05/07/2016 com mais de 56 mil assinaturas e foi elaborado pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais, em conjunto com diversas organizações da sociedade civil após o rompimento da barragem da Samarco, cujas donas são a Vale e a BHP Billiton.

Para os ambientalistas é um avanço muito importante para Minas Gerais, ainda tão ameaçada pelos interesses minerários. Para Maria Teresa Corujo, a Teca, o momento é histórico. “Estamos diante de bombas relógio. Podemos ter outras tragédias a qualquer momento. No dia anterior à votação tivemos um momento de forte embate na Assembleia e, por um ‘milagre’, a Casa Legislativa aprovou o texto que contempla na totalidade a versão final do ‘Mar de Lama Nunca Mais’. Agora temos um marco legal em Minas Gerais que trata verdadeiramente de segurança de barragens em relação às novas barragens, aos alteamentos e à ampliação das existentes”, afirma.

Para a promotora Andressa Oliveira Lanchotti, a questão econômica não pode continuar se sobrepondo e a atividade da mineração tem que ser mais sustentável. “Nós buscamos a sustentabilidade real. Não somos contra a mineração de forma alguma. A atividade de mineração é fundamental para o estado de Minas Gerais. Só que nós estamos aqui insistindo na questão que há tecnologias mais modernas, de menor risco, de menor potencial de dano para a disposição dos rejeitos. É possível fazer mineração com menor risco para a sociedade e para o meio ambiente também”, concluiu.

Pressão dos CBHs

O Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas), em conjunto com o Fórum Mineiro de Comitês de Bacias Hidrográficas (FMCBH) e o Fórum Nacional de Comitês de Bacias Hidrográficas (FNCBH) cobraram mudanças nos procedimentos adotados no licenciamento ambiental, a instalação de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) relacionadas à mineração na Câmara Federal, no Senado e na ALMG, assim como a criminalização e a responsabilização da Vale pelo desastre com a barragem que se rompeu em Brumadinho.

No dia 1º de fevereiro, representantes dos Comitês das Bacias Hidrográficas dos Rios das Velhas, Paraopeba e São Francisco, além de cidadãos e ambientalistas de movimentos e organizações sociais, realizaram uma manifestação em frente à ALMG cobrando justiça do poder legislativo por todas as vidas perdidas e pelo crime cometido pela Vale em Brumadinho, bem como um posicionamento sobre o PL “Mar de Lama Nunca Mais”, que estava esperando votação da casa desde 2016.

O presidente do CBH Rio das Velhas e do FMCBH, Marcus Vinícius Polignano, explica que é preciso uma legislação mais eficiente. “O caso de Brumadinho foi o quarto ou quinto rompimento de barragem nos últimos anos com este caráter tão calamitoso. Um dos problemas é que as licenças de estabilidade são conseguidas depois de uma auditoria contratada pelas próprias empresas, o que é uma furada!”

Para Polignano, sempre foi fundamental a mudança na legislação de segurança de barragens. “O que nós queremos é que se mude a legislação em nível nacional, que se instale as CPIs no Senado e na Câmara Federal, para que se apure não só as responsabilidades, mas todas as fragilidades da legislação que permitiram que essa situação criminosa acontecesse em Minas Gerais”, diz.

Projeto de lei aprovado na ALMG (à direita) foi amplamente defendido pelos Comitês de Bacias Hidrográficas, como em reunião conjunta do FNCBH e FMCBH (à esquerda)

Protesto lembra vítimas da barragem da Vale

Para marcar um mês do rompimento da barragem da mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, cerca de 400 pessoas se vestiram de preto para pedir justiça, no dia 24 de fevereiro, em frente ao Memorial Minas Gerais Vale, na Praça da Liberdade, Região Centro-Sul de Belo Horizonte. A ação foi uma iniciativa do Movimento Águas e Serra de Casa Branca.

O protesto foi organizado por ambientalistas, artistas e moradores de regiões próximas a barragens de minério e foi marcado por muito simbolismo: faixas, cartazes, cruzes pelo chão e a maquete de uma barragem por onde escorreu sangue ao invés de lama. No peito, os manifestantes carregavam nomes de pessoas que perderam a vida na tragédia da Vale em Brumadinho.

Muita gente se emocionou quando houve o toque de silêncio, seguido pelo soar de uma sirene que simulou um alerta de rompimento de barragem. O protesto terminou ao som de violinos e muita gente deixou a praça com o receio de que Minas Gerais não esteja livre de tragédias como as de Mariana e Brumadinho.

Os ambientalistas também protestaram contra as políticas de licenciamento ambiental adotadas no estado mesmo depois da tragédia e criticaram a volta da mineração na Serra da Piedade, em Caeté, Região Metropolitana de Belo Horizonte.

 

Assessoria de Comunicação CBH Rio das Velhas:
TantoExpresso Comunicação e Mobilização Social
*Texto: Luiza Baggio
*Fotos: ALMG, Michelle Parron e Ohana Padilha

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