A vazão do Rio das Velhas, que abastece cerca de 60% da população da Grande BH, apresentou uma leve melhora com o período de chuvas. Mas, mesmo assim, o alerta de escassez de água continua.

Em geral, a população associa a disponibilidade hídrica para atender aos diferentes usos nas áreas urbanas com o regime das chuvas. Se passamos por um período com abundância de chuvas, imaginamos que há muita água disponível. Em metrópoles como Belo Horizonte, em que a população não tem contato com os sistemas físicos que geram a água que usamos, esta percepção é ainda mais forte. Entretanto, se as chuvas caem, mas se não há mecanismos de retenção/absorção da água no sistema, ela escoará para outros territórios.

É o que mostram os dados da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa). Com as fortes chuvas os níveis dos reservatórios elevam e, quando passam um ou dois dias sem chover, caem drasticamente. Por exemplo: no dia 09 de março a vazão do Rio das Velhas, em Honório Bicalho, município onde é realizada a captação de água para abastecimento de parte de Belo Horizonte, chegou a um pico de 133,4 m³/s. No entanto, passados quatro dias de estiagem, no dia 13 de março, caiu para 48,2 m³/s e vem mantendo essa média até hoje (22 de março).

O professor do Instituto de Geociência da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), que atua nas áreas de geomorfologia fluvial e recursos hídricos continentais, Antônio Pereira Magalhães Júnior, explica que um dos principais mecanismos de auxílio à retenção da água no subsolo é a vegetação. “A cobertura vegetal intercepta as chuvas e auxilia na infiltração e recarga dos aquíferos subterrâneos que, por sua vez, determinam a existência de nascentes permanentes que originam os cursos d´água”, esclarece.

A Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas vem sofrendo com a degradação ambiental em diferentes aspectos e a vegetação foi degradada e removida ao longo do tempo. Nas áreas rurais foi substituída por pastagens, áreas de cultivos e solo exposto, os quais não retêm as águas das chuvas de forma tão eficiente quanto à vegetação original. Já nas áreas urbanas, a impermeabilização do solo por asfalto impede a infiltração, aumentando o escoamento superficial e gerando cheias intensas dos rios, como ocorre em Belo Horizonte.

“A questão é que a maior parte desta água não fica retida para ser posteriormente utilizada. Ela se esvai ao longo dos rios, gerando problemas de inundação durante ou imediatamente após as chuvas, mas não contribuem para o armazenamento hídrico no sistema local. Os reservatórios de água da Copasa podem ter um aumento repentino e significativo em função das intensas chuvas de verão na Região Metropolitana de Belo Horizonte, porém as crescentes demandas de água pelos diferentes usos na Bacia e a baixa reposição na estação seca (abril a setembro) não garantem a continuidade da manutenção de níveis hídricos adequados nos reservatórios ao longo do tempo”, relata o professor Antônio.

O engenheiro civil e integrante do movimento SOS Nova Lima, Júlio Grillo, destaca ainda que a região do Alto Rio das Velhas perdeu inúmeras matas ciliares e diversas nascentes nos afluentes a montante de Bela Fama, na região de Nova Lima, em função dos empreendimentos imobiliários ali implantados, minerações e baixa fiscalização. Segundo o especialista, os órgão de governo ligados ao meio ambiente precisam levar em consideração os impactos da perda de água acumulados sobre a captação de Bela Fama para assim licenciar novos empreendimentos na região do Alto. “Não é prudente, nem sustentável continuar licenciando empreendimentos no Alto Rio das Velhas”, afirma.

 Empreendimentos, sobretudo minerários, e expansão da mancha urbana são fatores que comprometem a capacidade de reter a água que cai em toda a bacia.

A perda de resiliência

Ao longo do tempo, a Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas vem perdendo elementos que contribuem para a sua resiliência, como a cobertura vegetal que auxilia na proteção contra a erosão acelerada e parte significativa de suas vazões fluviais. Parte das águas que fluiriam naturalmente nos eixos fluviais passaram a ser captadas para atender aos usos humanos e parte deixou de chegar aos eixos fluviais devido às interferências nas variáveis do ciclo hidrológico regional, como é o caso da infiltração.

Como agravante, a Bacia do Rio das Velhas, principalmente em seu Alto curso, apresenta uma intensa ocupação por atividades potencialmente degradadoras. Além da expansão imobiliária, podemos citar a mineração no Quadrilátero Ferrífero.

Ademais, na região do Alto, o Rio das Velhas apresenta-se poluído por esgotos e efluentes industriais. “Todo este complexo de usos da terra e das águas se reflete em importantes demandas hídricas e pressões-impactos nas artérias fluviais, reduzindo a capacidade de absorção e auto-recuperação do sistema” informa o professor da UFMG, Antônio Magalhães.

Os investimentos no setor de saneamento, com a coleta e tratamento de esgotos e efluentes, bem como disposição e tratamento adequado de resíduos sólidos, são essenciais para o aumento da resiliência dos sistemas fluviais, já que a poluição e contaminação das águas dos rios é um dos principais problemas ambientais do país. Também não podemos nos esquecer da manutenção e recuperação da cobertura vegetal, do respeito às áreas legalmente criadas para a proteção dos rios (como as Áreas de Preservação Permanente) e atenção redobrada aos processos de licenciamento ambiental de atividades potencialmente degradadoras e aos processos de autorização de usos das águas dos rios (outorga) realizados pelo estado. “A resiliência dos rios depende, em última instância, de diversas dimensões ambientais, mas, especialmente, de vontade política”, esclarece.


Mais informações:

Assessoria de Comunicação CBH Rio das Velhas
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