A pressão da atividade minerária, que já é alvo de uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Câmara de Belo Horizonte para investigar a mineração na Serra do Curral, chega agora a outra importante área ambiental da região metropolitana da capital. O sinal verde dado pelo Conselho Consultivo do Parque Estadual da Serra do Rola-Moça para a reabertura de mina, com impacto sobre a unidade de conservação com mais de 3.900 hectares de área distribuída entre os municípios de BH, Brumadinho, Nova Lima e Ibirité, gerou reação de setores da sociedade civil e levou o Ministério Público a se manifestar contrariamente à liberação das atividades pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF), próximo órgão público a se manifestar no processo de licenciamento. Provocou ainda a saída do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas do Conselho do parque, como forma de protesto.
O parecer favorável do Conselho Consultivo da unidade à Mineração Geral do Brasil (MGB), para retomada das atividades da mina de Casa Branca foi considerado controverso, gerando grande pressão popular e de ambientalistas contra o empreendimento, sobretudo pelo potencial de danos aos corpos hídricos do parque. O Ministério Público informou ter recebido, apenas dois dias depois da manifestação do conselho, uma série de denúncias, reclamações e representação questionando a posição dos representantes da unidade de conservação.
Diante da reação, o MP, por meio da Primeira Promotoria de Justiça de Brumadinho e da Coordenadoria Regional das Promotorias de Justiça do Meio Ambiente das Bacias dos Rios das Velhas e Paraopeba, recomendou à direção-geral do IEF que “se abstenha de conceder ou expedir, ou que anule, caso já o tenha feito, a anuência requerida ao parque no âmbito do processo administrativo de licenciamento ambiental da MGB, relativamente a atividades minerárias ou de transporte e escoamento de minério, projetados para ocorrer dentro dos limites da referida unidade”.
Sob Protesto
A recomendação ocorreu apenas cinco dias depois de o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas (CBH Rio das Velhas) ter se retirado do Conselho Consultivo do parque, justamente por não concordar com o uso que entende estar sendo dado ao órgão. “Quando nos convidaram para integrar o conselho, entendemos que seria para o desenvolvimento de atividades de conservação e de educação ambiental. Mas, ao longo do tempo, acabamos servindo quase apenas para decidir sobre licenciamentos de atividades que causam impactos”, disse o presidente do comitê, Marcus Vinícius Polignano.
O IEF tem 10 dias para se posicionar diante da recomendação, assinada pelo promotor de Justiça do Meio Ambiente da Comarca de Brumadinho, Willian Garcia Pinto Coelho, e pelo coordenador regional das promotorias de Justiça do Meio Ambiente das Bacias dos Rios das Velhas e Paraopeba, Francisco Chaves Generoso. O instrumento é medida preventiva de que o Ministério Público dispõe para “ver respeitado o ordenamento jurídico, alertando seus destinatários sobre a existência de normas vigentes e da necessidade de seu estrito cumprimento, sob pena de eventual responsabilização nas esferas competentes”, informou o MP.
Entre as justificativas levantadas pelos representantes do MP para a recomendação está a vocação do parque para a conservação e não para atividades que gerem grande impacto. “É uma unidade de proteção integral, onde são possíveis apenas ações relacionadas a pesquisas científicas e ao desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico, não sendo permitidas atividades minerárias e acessórias ou quaisquer outras que comprometam a integridade dos atributos que justificam sua proteção”.
Mananciais no caminho
O presidente do Comitê de Bacia do Rio das Velhas destaca, ainda, que o empreendimento da MGB precisaria usar áreas internas da unidade de conservação estadual, gerando impacto considerável para a fauna, a flora e os recursos hídricos. Além de espécies vegetais endêmicos – que só existem no Quadrilátero Ferrífero – e de animais ameaçados de extinção, como o lobo-guará, o parque abriga seis mananciais de abastecimento de Belo Horizonte, Brumadinho e Ibirité (Tabões, Rola-Moça, Bálsamo, Barreiro, Mutuca e Catarina).
Polignano alerta para efeitos colaterais da atividade sobre o ecossistema do parque. “A mina teria de ter uma estrada de terra aberta para escoar sua produção dentro do parque. Para isso, teríamos uma derrubada absurda de mata nativa. O movimento de 80 viagens de caminhões por dia traria impactos diretos, como o atropelamento de espécimes e levantamento de detritos. Isso sem falar da lixiviação (carreamento de detritos com a chuva para corpos hídricos), que ameaça córregos e riachos de contaminação e assoreamento, impactando na qualidade e na quantidade de água de classe especial”, afirma Polignano.
Empresa defende ação fora do parque
Em defesa de seu empreendimento, a mineradora MGB informou que o projeto de mineração, com recuperação ambiental e fechamento da mina, segue a legislação vigente, e ocorre fora dos limites da unidade, “em área localizada na zona de amortecimento do Parque Estadual Serra do Rola-Moça”. Acrescentou ainda que “o projeto vai utilizar como via de escoamento as estradas atuais, com adequação de parte da via (1,3 quilômetro), com separação física das faixas existentes, permitindo o trânsito independente e seguro para os usuários”.
Consultada pelo Estado de Minas, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) informou haver dois processos de licenciamento de empreendimentos minerários na Serra do Rola-Moça: da MGB e da Mineração Santa Paulina. “Outros dois empreendimentos, as minas de Jangada e Córrego do Feijão, são contíguos e estão a uma distância de aproximadamente sete quilômetros do Parque da Serra do Rola-Moça. As minas pertencem à Vale S.A.”, acrescentou.
Em relação ao empreendimento da MGB, a Semad sustenta que o projeto é voltado para a recuperação ambiental paralelo à lavra – a justificativa é semelhante à que foi usada no caso da retomada da extração mineral nos limites da Serra do Curral, hoje alvo de CPI na Câmara de Belo Horizonte. “Existe um passivo oriundo das atividades ocorridas antes do embargo e da criação do parque, inclusive duas barragens de rejeito que não foram descomissionadas. A situação da MGB no Cadastro de Minas Paralisadas e Abandonadas da Fundação Estadual do Meio Ambiente (Feam) é descrita como paralisada e sem controle. Desse modo, a adoção de medidas no local é necessária para evitar, inclusive, problemas para as comunidades que estão a jusante das barragens”, argumenta a secretaria, em nota.
O texto prossegue afirmando que tanto o Conselho Consultivo do Parque do Rola-Moça quanto o Conselho Consultivo da APA Sul votaram a favor do projeto, “com a inclusão de diversas medidas de controle e compensação”. “O próximo passo do órgão ambiental é solicitar informações complementares ao empreendedor. Apenas após a conclusão acerca das anuências e a apresentação integral dessas informações é que a viabilidade será avaliada na licença prévia”, completou a nota.
Em relação aos processos de licenciamento das minas de Jangada e Córrego do Feijão, a Semad informou que o Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) aprovou, dia 11, as licenças de operação dos dois empreendimentos, com oito votos favoráveis, um contrário (Fórum Nacional da Sociedade Civil nos Comitês de Bacias Hidrográficas), duas abstenções (Ibama e Cefet) e uma ausência (exatamente a do Departamento Nacional de Produção Mineral). A secretaria sustenta que os processos tratam de mudança no sistema de deposição de rejeitos de mineração, com a adoção de método de menor risco, conjugada com aumento da exploração nos dois empreendimentos externos ao parque.
Já no caso da Mineração Santa Paulina, a secretaria informa tratar-se de análise de pedido de licença de operação corretiva, e que o projeto engloba áreas já afetadas pela antiga atividade minerária, sem retirada de vegetação ou aumento de áreas de mineração. “A Semad reforça que todas as questões técnicas e jurídicas relacionadas a esses projetos serão devidamente avaliadas e a viabilidade ambiental será concluída pela Câmara Técnica de Mineração do Copam”, órgão com assento da Agência Nacional de Mineração, do setor ambiental e da sociedade civil em geral.
Entenda o caso
Década de 1980
Funcionavam na ergião as minas de Casa Branca, Jangada e Córrego do Feijão, em Brumadinho e Sarzedo, na Grande BH, dentro da área de amortecimento onde o Parque Estadual da Serra do Rola-Moça hoje se situa
27 de setembro de 1994
O Parque Estadual da Serra do Rola-Moça é criado pelo Decreto Estadual 36.071, para proteger seis importantes mananciais de água que abastecem parte de Belo Horizonte, Ibirité e Brumadinho
2001
As atividades da mina de Casa Branca, então pertencente à Extrativa Paraopeba, são abandonadas. A lavra é passada para o controle da Mineração Geral do Brasil (MGB). O Ministério Público ingressa com ação para que o passivo ambiental deixado seja tratado, incluindo o descomissionamento de duas barragens de rejeitos. Mais tarde, a MGB tenta retomar a mineração, sob a justificativa de ter rentabilidade para as ações de reconstituição ambiental
7 de maio de 2018
Conselho do Parque Estadual Serra do Rola Moça discute anuência a dois projetos: o Centralidades Sul (C-Sul), que pretende instalar 60 mil pessoas na região da Serra da Moeda, e a Mineração Geral do Brasil (MGB), para extrair minério de ferro e operar na região do Parque Estadual da Serra do Rola-Moça
5 de novembro
O Conselho Consultivo do parque se reúne para discutir a retomada dos empreendimentos das mineradoras empresa MGB e dois empreendimentos assumidos pela Vale S.A (Córrego do Feijão e Jangada). Para os três processos houve pedido de vistas dos conselheiros
19 de novembro
Conselho Consultivo do parque delibera em favor da anuência para a MGB, em reunião do Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) com previsão, inclusive, de escoamento do minério em via no interior da unidade.
Como órgão consultivo, o conselho do parque é ouvido pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF), que deve se manifestar no processo. A viabilidade do empreendimento precisa ser analisada pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad)
21 de novembro
Ministério Público recebe uma avalanche de denúncias, reclamações e representação questionando a manifestação do conselho sobre o empreendimento da MGB
12 de dezembro
Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas se retira do conselho consultivo da unidade, por não concordar com o fato de a maioria das atividades ser de licenciamento, e não de preservação da natureza
17 de dezembro
O Ministério Público recomenda que o IEF não conceda parecer favorável ao empreendimento da MGB
Os projetos de licenciamento tramitam no Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam), que os remete ao Instituto Estadual de Florestas (IEF). Parte do processo, o Conselho Consultivo do Parque Estadual da Serra do Rola Moça precisa se manifestar sobre sua concordância com a atividade. Resta, agora, o IEF emitir um parecer e o Copam analisar a questão.
*Fonte: Estado de Minas
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